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Filipe Karlsson
22 Novembro, 2018
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Carnim
15 Novembro, 2018

Ana Moura – Um fado com mundo

Não há outra voz no fado como a de Ana Moura. Uma voz que se passeia pela tradição livremente, sem deixar de flirtar elegantemente com a música pop, alargando de uma forma muito pessoal o raio de acção da canção de Lisboa. Mas aquilo que a distingue é não apenas um timbre grave e sensual como há poucos – Ana Moura transforma instantaneamente em fado qualquer melodia a que encoste a sua voz. É um rastilho imediato, uma explosão emocional disparada sem contemplações ao coração de quem a ouve.

Fausto, José Afonso, Ruy Mingas, música angolana e fado. Era isto que se cantava nos serões da família Moura, em Coruche, era Ana Moura apenas uma catraia – nasceu numa outra localidade ribatejana, Santarém, em 1979 – com gosto pelas cantorias. Os pais cantavam, toda a família materna cantava e qualquer motivo de reunião familiar terminava com um festejo sob a forma de música. Embora cantasse de tudo, Ana começava já a sentir que, por alguma razão, tinha um carinho especial pelo fado. Aos seis anos cantava já o seu primeiro fado, “Cavalo Ruço”, enquanto ouvia frequentemente a mãe trautear “O Xaile de Minha Mãe”. Depois, veio a adolescência e deixou o fado adormecido. E despertou para outros tipos de música, mais condizentes com a idade e as amizades liceais.

É com essa curiosidade por outras músicas, em plena adolescência de descobertas e rebeldias, que Ana Moura chega a Carcavelos, com 14 anos, para fazer o 10º ano. Chega não para cantar, mas para estudar, inscrevendo-se então na Academia dos Amadores de Música. Mas é aos colegas de escola que se junta para a primeira banda. Apesar de cantar outros géneros, a verdade é que, deixada à sua sorte, a voz de Ana rapidamente se cola ao registo fadista e, assim, mesmo com grupos de rock vai conseguindo incluir um ou dois fados no repertório – habitualmente, “Povo que Lavas no Rio”, de Amália, nessa fase a sua referência máxima enquanto intérprete.

A experiência com essa banda de covers, os Sexto Sentido, acaba depois por conduzir ao início de gravações de um disco pop/rock com o músico Luís Oliveira, cujo lançamento fazia parte da agenda da multinacional Universal. O disco, no entanto, não chega a ser terminado. Entra em cena o destino e leva Ana Moura a um bar em Carcavelos onde cede à tentação e canta um fado. Presente na sala, o guitarrista António Parreira, de tão impressionado, toma-a pela mão e leva-a a várias casas de fado. Até ao momento em que, numa festa de Natal de músicos e fadistas, Ana Moura é levada ao convívio daqueles que haveriam de habitar as suas noites daí em diante e é convidada a cantar. Desta vez, é Maria da Fé, co-proprietária da prestigiada casa de fados Senhor Vinho, quem não resiste àquele talento em bruto. Aos aplausos, Maria da Fé junta o convite para cantar na sua casa.

É precisamente nesses ambientes nocturnos, do Senhor Vinho mas também das outras casas de fados que começa a frequentar, que se dá a verdadeira escola do seu canto. Antes, Ana Moura cantava o fado porque sim, porque a intuição lhe mandava, porque a boca lhe fugia para ali. Agora, os ensinamentos dos mais experientes – sobretudo Maria da Fé e Jorge Fernando – dão-lhe outros porquês, sem lhe matar a espontaneidade.

Essa paixão manifesta-se de tal maneira que rapidamente conquista Miguel Esteves Cardoso (MEC). Antes sequer de as editoras ouvirem falar no seu nome, é a escrita de MEC que serve de amplificador para a notícia do talento da jovem fadista, depois de a ouvir e ver actuar num programa de António Pinto Basto na RTP1 chamado Fados de Portugal. É inclusivamente depois de ler as palavras enlevadas de MEC no Independente que Tozé Brito, administrador da Universal, vai ao Senhor Vinho à descoberta daquela voz que conhecia apenas dos Sexto Sentido. Não demora a propor-lhe a gravação do primeiro disco. Para a produção do álbum de estreia, Guarda-me a Vida na Mão (2003), é chamado Jorge Fernando. Além de comandar a direcção artística do álbum, o músico é igualmente responsável por seis dos 15 temas gravados, um dos quais é assumido pela cantora como o seu BI musical – “Sou do Fado, Sou Fadista”. A cumplicidade entre os dois há-de manter-se nos discos seguintes. Logo aí, fica evidente que o fado de Ana Moura comporta uma elasticidade rara, convocando participações de gente como os Ciganos d’Ouro e Pedro Jóia, e instrumentos com o cajon e a guitarra de flamenco. Mas o essencial mantém-se intocado: a tradição não arreda pé. A recepção, crítica e de público, a Guarda-me a Vida na Mão é de um entusiasmo que não deixa dúvidas e Ana Moura começa de imediato a tornar-se presença recorrente nos palcos portugueses e, progressivamente, também nos internacionais.

Aconteceu, em 2004, é a continuação lógica do disco de estreia. Tratando-se de um álbum duplo, revela uma surpreendente ambição por parte da cantora, ao mesmo tempo que vinca com uma espantosa confiança a certeza do seu caminho: a convivência natural entre o fado mais apegado à tradição e uma forma muito pessoal e convicta de lhe exigir contemporaneidade.

A carreira de Ana Moura começa a ganhar um tamanho fôlego que a fadista acaba por abandonar o Senhor Vinho, a fim de poder dar resposta aos muitos convites que vai recebendo para tocar fora do país. Essa falta é mais tarde colmatada pela integração do elenco de uma nova casa de fados, em Alfama, de nome Casa de Linhares – Bacalhau de Molho. A internacionalização leva então Ana Moura a actuar na mítica sala Carnegie Hall, em Nova Iorque, em Fevereiro de 2005. Do outro lado do mundo, o saxofonista dos Rolling Stones Tim Ries entra na Tower Records de Tóquio à procura de discos de fado. Leva já na cabeça a ideia de incluir uma fadista no segundo volume do Rolling Stones Project, um projecto por si liderado que convida gente de outras marés musicais a interpretar temas dos Stones em colaboração com um dos históricos músicos da banda. Compra três CD às escuras, por mero instinto, e foi amor à primeira audição. Para o disco, Ana grava “Brown Sugar” e “No Expectations”. Ao vivo, interpreta este último com os Stones no Estádio Alvalade XXI. A partir daí, em várias ocasiões, as digressões de Ana Moura e dos Rolling Stones coincidem nos mesmos sítios. Numa delas, em São Francisco, Ries liga para a fadista e mostra-lhe uma música que compôs a pensar na sua voz. “Velho Anjo”, entraria no disco seguinte de Ana Moura, Para Além da Saudade (2007), depois de “afadistado” por um arranjo de Jorge Fernando.

Um dos trunfos de Para Além da Saudade, aliás, seria a rara participação de Fausto num disco alheio. Ana, que crescera a ouvir o autor de Por Este Rio Acima, perdeu a vergonha e pediu-lhe uma composição. Outra das autoras convidadas, desta vez a compor expressamente para si, foi Amélia Muge. A troca com outras culturas ficou então por conta de um dueto com o histórico cantor espanhol Patxi Andión. Tim Ries, além de autor, deixaria também o seu saxofone impresso em dois temas do disco – “Velho Anjo” e “A Sós com a Noite”. Graças ao tema “Os Búzios”, de Jorge Fernando, o sucesso de Para Além da Saudade havia de escalar até níveis inéditos na carreira de Ana Moura, acabando por gozar de dois grandes momentos de consagração em Portugal através da actuação nos Coliseus de Lisboa e do Porto. O álbum trar-lhe-ia ainda o Prémio Amália Rodrigues.

Após o sucesso gigantesco de Para Além da Saudade – há 70 semanas na tabela dos mais vendidos quando o quarto álbum chega às lojas –, a edição de Leva-me aos Fados (2009) é saudada quase de imediato com a obtenção do galardão de platina. Como habitualmente, é produzido por Jorge Fernando e conta com letras de Tozé Brito, Manuela de Freitas, Mário Rainho e Nuno Miguel Guedes, assim como uma composição original de José Mário Branco. O álbum inclui mais uma criação encomendada à inventividade de Amélia Muge. “Não É Um Fado Normal” conta com a participação dos Gaiteiros de Lisboa e vinca o percurso distinto da fadista, de resto evidente logo no próprio título.

Em Maio de 2009, após um primeiro contacto telefónico, Prince desloca-se propositadamente a Paris para presenciar à sua frente o charme da fadista na sala La Cigale. A 18 de Julho de 2010, Ana Moura volta a colocar o fado num grande espectáculo do universo pop/rock, ao subir ao palco com Prince no encore do concerto do músico no Festival Super Bock Super Rock, no Meco. Juntos interpretam uma versão em português de “Walk in Sand” e o fado tradicional “Vou Dar de Beber à Dor”.

Em Setembro de 2010, Ana Moura aceita o convite da Frankfurt Radio Bigband para cantar em dois concertos na cidade alemã, sendo a parceria repetida, mas desta feita em sentido inverso, quando a fadista chama a orquestra de jazz a acompanhá-la, em Abril de 2011, no seu regresso aos Coliseus de Lisboa e Porto. Para Ana Moura, é um momento de celebração de um ano marcado pela vitória de um Globo de Ouro , pela presença nos tops de vendas da Billboard e da Amazon e pela nomeação enquanto Artista do Ano para os prémios da revista inglesa Songlines. Passados escassos meses, em Agosto, sobe ao palco do festival Back2Black, no Rio de Janeiro, ao lado de Gilberto Gil, com quem interpreta o “Fado Tropical” de Chico Buarque.

Para 2012, ano em que Ana Moura participa no disco de homenagem a Caetano Veloso com uma versão de “Janelas Abertas nº2”, produzida por José Mário Branco, a cantora guarda uma pequena mudança na sua linguagem musical. Em novembro lança em Portugal o seu 5.º álbum de originais “Desfado”, que representa um momento de viragem na sua carreira, e apresenta o seu mais recente trabalho em salas esgotadas por Portugal.

“Desfado” é já considerado um álbum clássico em Portugal. Mantém-se ininterruptamente no top de vendas desde que foi lançado (há 150 semanas consecutivas), tendo atingido recentemente a 5.ª Platina. Este é o disco nacional editado nos últimos cinco anos mais vendido em Portugal, o disco que globalizou Ana Moura. O primeiro editado globalmente pela Universal Music, através da Decca, chegou ao 1.º lugar várias vezes em Portugal, tendo atingido o n.º 1 dos top’s de World Music em Inglaterra, Espanha e Estados Unidos. “Desfado” reuniu alguns dos melhores compositores da atualidade e o single que lhe dá o nome tornou-se no primeiro fado a ser tocado nas rádios mainstream nacionais. A tour “Desfado” levou Ana Moura a grandes palcos nacionais e internacionais, cantando para multidões nos mais de 300 concertos que realizou depois de editar “Desfado”.

Com mais de 300.000 discos vendidos, mais de 1 dezena de galardões onde se destacam 2 Globos de Ouro, 2 prémio Amália, 1 nomeação para os Songlines Music Awards na categoria de Melhor Artista, participações com ícones da música Prince, The Rolling Stones, Caetano Veloso, Gilberto Gil ou Herbie Hancock, Ana Moura é a artista nacional com a carreira mais pujante da atualidade.

“Moura”, o 6.º álbum de Ana Moura, editado em Portugal no dia 27 de Novembro de 2015, foi diretamente galardoado com a marca de Disco de Ouro.

Do seu canto, sabemos apenas que nasceu no fado. Nunca saberemos onde termina.
(in Ana Moura Oficial)

Biografia Ana Moura

Ana Cláudia Moura Pereira  (Santarém, 17 de setembro de 1979) é uma fadista portuguesa. Considerada a fadista mais bem sucedida e premiada do século XXI Ana Moura já vendeu mais de um milhão de discos no mundo todo, sendo uma das recordistas de vendas de discos em Portugal.

Ana Moura é natural de Coruche, mas como esta vila não dispunha de maternidade, foi nascer na capital do distrito, ou seja, Santarém. Os seus pais cantavam em festas familiares e aos seis anos Ana Moura já cantava o Cavalo Ruço, enquanto ouvia frequentemente a mãe trautear O Xaile de Minha Mãe. Na adolescência, altura em que se transfere para Carcavelos, frequenta a Academia dos Amadores de Música.

Apesar do interesse pelo Fado, Moura tem as suas primeiras atuações numa banda de covers de pop/rock, os Sexto Sentido, formado com colegas de escola. A experiência acaba por conduzir ao início de gravações de um disco com o músico Luís Oliveira, cujo lançamento fazia parte da agenda da multinacional Universal. O disco, no entanto, não chega a ser terminado.

Certo dia Ana Moura está num bar em Carcavelos, cede à tentação e canta um fado. Impressionando o guitarrista António Parreira, que estava presente na sala, este toma a iniciativa de apresentar a jovem a Maria da Fé. Contratada por Maria da Fé para o Senhor Vinho, Ana Moura tem nesta casa de fados uma verdadeira escola, onde bebe dos ensinamentos de Maria da Fé ou Jorge Fernando.

Os dotes da jovem fadista também conquistam Miguel Esteves Cardoso que, de forma indireta, contribui para a gravação do seu primeiro álbum. O acaso ocorreu após Esteves Cardoso ver Ana Moura cantar numa das suas primeiras aparições na televisão; o programa da RTP Internacional, Fados de Portugal, conduzido por António Pinto Basto. Esteves Cardoso resolve escrever uma crónica sobre ela n’O Independente (cf. O susto do fado e a beleza da verdade. A Preguiça, in O Independente, 16 de fevereiro de 2001), que será lida por Tozé Brito, então administrador da Universal. Brito resolve ir ao Senhor Vinho à descoberta daquela voz que conhecia apenas dos Sexto Sentido e logo propõe a Ana Moura a gravação do seu primeiro disco; surge assim Guarda-me a Vida na Mão (2003).

Aconteceu (2004) e Para Além da Saudade (2007) foram os álbuns subsequentes; este último contem músicas como Os Búzios ou O Fado da Procura. Com este disco Ana Moura chegou ao conhecimento do grande público, o álbum alcançou a tripla platina, por vendas superiores a 55 mil unidades, levando a cantora a permanecer 120 semanas no Top 30 de Portugal. Com o mesmo disco recebeu uma nomeação para os Globos de Ouro, na categoria de Música, para Melhor Intérprete Individual, que acabou por perder para Jorge Palma.

Em 2007, Moura participou no concerto dos Rolling Stones no Estádio Alvalade XXI, em Lisboa, cantando, em dueto com Mick Jagger, o tema No Expectations.

Depois de dois grandes concertos nos Coliseus do Porto e de Lisboa, Moura lança finalmente o seu primeiro DVD ao vivo, a 24 de Novembro de 2008, que obtém grande sucesso junto ao público, pelo seu excelente alinhamento.

Reconhecida internacionalmente como uma voz raríssima de Contralto, chegou também o reconhecimento dos pares e, em 2008, Ana Moura recebeu o Prémio Amália de melhor intérprete.

Em concerto, Varsóvia, 2009
Em 2009 o norte-americano Prince confessa-se fã da fadista, mostrando interesse em colaborar musicalmente com Moura, vindo a fazê-lo no Festival de Verão, Super Bock Super Rock, em 2010.

“Leva-me aos Fados”, lançado a 12 de Outubro de 2009 (apresentado na Casa da Música – Porto e Coliseu de Lisboa, a 20 e 21 de Outubro), foi Disco de Platina, estando semanas consecutivas no Top 10 dos discos mais vendidos. O álbum incluiu fados como Leva-me aos Fados (single de apresentação), Caso Arrumado, Rumo ao Sul e Fado Vestido de Fado.

Ana Moura recebeu, a 23 de Maio de 2010, nos “Globos de Ouro” o globo de “Melhor Intérprete Individual”, para o qual estava nomeada juntamente com artistas como Carminho, David Fonseca ou Rodrigo Leão.

A 17 de Março de 2011, Ana Moura foi nomeada para “Best Artist Of The Year”, um dos importantes prémios da prestigiada revista inglesa de música Songlines.

Em Junho e Julho do mesmo ano, a fadista efectuou uma pequena digressão aos Estados Unidos e ao Canadá, que incluiu concertos em quatro famosos festivais de Jazz – S. Fancisco, nos Estados Unidos, e Vancouver, Montreal e Otava, no Canadá. Em Montreal, Moura foi uma das cabeças de cartaz do 32º. festival de jazz internacional e no espectáculo agradou à sala cheia do Teatro Maisonneuve, no qual teve como convidado especial o saxofonista Tim Ries, criador do Projecto Rolling Stones.

Em Novembro de 2012 é lançado o quinto disco da cantora, chamado de “Desfado”. O álbum acaba por ser um sucesso sem precedentes, permanecendo no primeiro lugar do Top 30 de Portugal por bastante tempo. Juntamente com o lançamento do álbum, Moura fez uma torné pelo país e fora dele, com concertos centrados mais no norte de Portugal, e fora, passando pelos E.U.A., Canadá, México, Reino Unido, Áustria, Holanda, Alemanha, Noruega, Bélgica e ainda Angola.

A 27 de Janeiro de 2015 foi feita Comendadora da Ordem do Infante D. Henrique. No final do mesmo ano, Moura lançou o trabalho mais recente titulado simplesmente “Moura”, acompanhado pela canção Dia de Folga.

Em 2016, Ana Moura recebeu um Globo de Ouro na categoria de Melhor Música com “Dia de Folga”, canção com letra e música de Jorge Cruz.

Moura é atualmente uma das fadistas mais conceituadas de Portugal, pelo seu excelente timbre de voz, beleza e enorme simpatia para com o seu público. (in wikipedia)